Artigo – Boleiros: mentiras e jogo de empurra-empurra

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Kátia Sleide

Quarta-feira (7) foi realizada audiência pública, proposta pelo deputado Ricardo Vale (PT), para discutir a aplicação dos recursos do Programa Boleiros (Lei nº 5.649/16), de autoria dos deputados Julio César (PRB), Ricardo Vale e Wasny de Roure (ambos PT), com o objetivo de fomentar e apoiar o desenvolvimento do esporte amador no Distrito Federal.

Como apresentar os números reais de um programa/lei que desde 2015 é regado a mentiras, jogo de empurra-empurra e dissimulações? É difícil ter de usar esses termos, porque as palavras dirigidas são duras demais para serem propagadas.

Contudo, dura é a realidade do futebol amador do Distrito Federal e outras 16 modalidades que foram incluídas na Lei Nº 5.649/16, Nem o Programa Boleiros, muito menos a Lei nº 5.649 (oriunda do programa) foi executada pela Secretaria de Esporte, de 2015 até a atual data, conforme o previsto. Não se respeitou o calendário das ligas amadoras de futebol. Não se respeitou a história da luta dos guerreiros do futebol amador e de base, que levaram 20 anos para se conquistar um programa voltado para as comunidades esportistas de todo o DF. Não se respeitou o esforço empenhado pelos presidentes de ligas ou associações, equipes (mais de mil no futebol amador do DF) e atletas (adulto e de categorias de base). Todos tiram do bolso para fomentar o esporte que é o dever do Estado.

Não faltam argumentos para justificar os problemas ocorridos. Uma hora, a Secretaria de Esporte coloca a culpa na falta de verba. Em outra, na falta de pessoal. E há também a desculpa de que estão tentando fazer tudo dentro da legalidade.

Também não nos faltam contra-argumentos: Quanto à verba, esta foi destinada por quatro parlamentares. Há divergências do que foi de fato destinado e o que foi liberado. Sem falar nos valores que não foram utilizados pela Secretaria de Esporte, deixando de atender outras entidades esportivas (assunto que trataremos mais à frente).

Quanto à falta de pessoal, vale destacar que três anos se passaram e nada foi feito para corrigir. A comunidade esportiva não pode pagar o preço alto que está pagando por conta de problemas administrativos de todo e qualquer órgão do governo. Quem tem de dar a solução são os gestores e não quem está na ponta.

Em se tratando de legalidade, fica evidente a falta de preparo para agilizar os recursos e atender às demandas dos setores. Tem de fazer tudo dentro da legalidade, sim, mas tem de ter agilidade também. Isso é responsabilidade dos gestores públicos. Se estão encontrando dificuldades por falta de entendimento, tenham a humildade de chamar os setores para conversar e contribuir com solução do problema.

São três anos esperando que as coisas aconteçam de maneira mais simplificada e dentro da legalidade, mas o que prevalece é a protelação, o jogo de empurra-empurra. Estamos em março de 2018 e o edital que vislumbra atender às demandas de todas as modalidades previstas na lei ainda não saiu. Pior: com exceção do futebol amador, as demais modalidades não foram ouvidas. Sendo assim, a Secretaria de Esporte não tem um diagnóstico do valor básico para atendê-las.

Como irão atender 17 modalidades igualitariamente, respeitando as devidas proporções, se não se ouviu as entidades responsáveis?

Mas além desses imbróglios, há também “maquiagem” nos valores reais destinados para a execução da bendita lei. O que os deputados divulgam, no tocante às verbas liberadas, não bate com o montante de fato destinado ao atendimento das entidades.

No documento fornecido pela Secretaria de Esporte ao jornal Viver Sports, a planilha mostra claramente as divergências, conforme quadros abaixo:

A leitura correta não é a mesma propagada pelos parlamentares, que não mencionam os cancelamentos feitos por eles mesmos de valores das emendas. Embora destacou o parlamentar Ricardo Vale durante a audiência do dia 7/3, que há justificativas para esses cancelamentos.

Mesmo assim, precisamos cobrar que eles hajam com transparência, que divulguem o valor que realmente liberaram e justifiquem o cancelamento de parte, quando houver. Porém, essas divergências de valores destinados não invalidam as ações dos distritais que abraçaram a causa. Recebam a gratidão da comunidade esportiva.

Assim como também vale destacar que a secretária-adjunta não quis, durante audiência pública do dia 7/3, tocar no assunto para não constranger os deputados. Oi? Como assim? Isso é um trato de cavalheiros?

Por mais que os dados estejam no portal de transparência, nem todos conseguem fazer a leitura correta deles. E se gestores e parlamentares forem questionados, eles têm de responder, sim, às interrogações. Constrangidos ficam todos os que tentam fomentar o esporte no DF e são tratados com desdém, mesmo diante de uma lei sancionada há dois anos.

Comparem as informações*

Ricardo Vale – De 2015 a 2017, de acordo com planilha da Secretaria de Esporte, subentende-se que o deputado Ricardo Vale destinou R$ 3 milhões para o Boleiros. Porém, na verdade, foram destinados R$ 2 milhões. O parlamentar cancelou R$ 1 milhão em 2015. Mesmo assim, a Secretaria utilizou apenas R$ 1,680.427,43 (um milhão, seiscentos e oitenta mil, quatrocentos e vinte e sete reais e quarenta e três centavos), deixando de investir R$ 319.572,57 (trezentos e dezenove mil, quinhentos e setenta e dois reais e cinquenta e sete centavos). Justificativa: Segundo Ricardo Vale, esse recurso que foi cancelado, em 2015, quando ainda não tinha a lei. Colocamos R$ 1 milhão para o Boleiros, mas como a Secretaria de Esporte não executou, no final do ano, o próprio governo pediu autorização para retirar para pagamento de pessoal e de outras despesas, senão perderia a emenda. Foi por isso que a emenda foi cancelada.

Julio César – Pela planilha da Secretaria de Esporte, o distrital destinou, inicialmente, R$ 2,3 milhões para o programa/lei, de 2015 a 2017. Em pratos limpos, o mesmo liberou apenas R$ 1.020.000 (um milhão e vinte mil reais) e cancelou R$ 1.280.000 (um milhão, duzentos e oitenta mil) – R$ 700, em 2015; R$ 180, em 2016; e R$ 400, em 2017. Do montante real destinado por Julio César (R$ 1.020.000), a Secretaria utilizou R$ 544,305 (quinhentos e quarenta e quatro mil, trezentos e cinco reais), ficando R$ 475.695 (quatrocentos e setenta e cinco mil, seiscentos e noventa e cinco reais). Justificativa: “As emendas destinadas ao Boleiros ou a qualquer outro programa, quando não executadas, são revertidas ao governo no final do ano, que decide de que forma vai remaneja-las. Normalmente é a destinada à saúde ou qualquer necessidade emergencial do momento”, explicou a assessoria de imprensa do parlamentar.

Wasny de Roure – O parlamentar teria destinado entre 2015 e 2017, segundo a planilha da Secretaria de Esporte, R$ 900.000 (novecentos mil) – R$ 500.00, em 2016; e R$ 400.000, em 2017. Porém, teria cancelado R$ 714.718 (setecentos e quatorze mil) – R$ 500.000 (quinhentos mil), em 2016; e R$ 214.718 (duzentos e quatorze mil, setecentos e dezoito reais), em 2017. Ainda segundo a planilha fornecida pela Secretaria de Esporte, somente foram liberados para utilização R$ 185.281 (cento e oitenta e cinco mil, duzentos e oitenta e um reais). Neste caso, há questionamento também, porque segundo informações em 2016, o deputado Wasny não cancelou a emenda de R$ 500.000 (quinhentos mil reais), mas a Secretaria teria dado outra designação à verba. Quanto à devolução, atente-se à explicação da assessoria de imprensa do parlamentar. Justificativa: “Em todo encerramento de ano as emendas não executadas pelo executivo, nesse caso específico, Secretaria de Esportes, são canceladas ou remanejadas para outras áreas para uma melhor otimização do erário público”.

Agaciel Maia – O mesmo destinou R$ 1.000.000 (um milhão de reais) e não houve, por parte dele, cancelamento. Porém, a Secretaria utilizou apenas R$ 216.499,87 (duzentos e dezesseis mil, quatrocentos e noventa e nove reais e oitenta e sete centavos).

– Total de emendas liberadas pelos quatro distritais: R$ 4.705.282,00

(quatro milhões, duzentos e cinco mil, duzentos e oitenta e dois reais)

– Valor utilizado pela Secretaria de Esporte do DF:     R$ 2.623.514.00

(dois milhões, seiscentos e vinte e seis mil, quinhentos e quatorze reais)

 (*) Dados fornecidos pela Secretaria de Esporte do DF em 7/3/2018.

Percentuais

Do montante destinado para o Programa Boleiros da Secretaria de Esporte, o percentual de cada distrital ficou assim:

– Ricardo Vale………….42%

– Julio César:…………..22%

– Agaciel Maia:…………21%

– Wasny de Roure:……15%

Legalidade

O discurso de que a demora está vinculada à tentativa de agir dentro da legalidade vai por terra quando, considerando que o programa passou a ser uma lei, já deveria estar prevista a verba no orçamento anual desde 2016. O que evitaria que as entidades esportivas tivessem de correr atrás de deputados distritais para liberar emendas em 2017 e 2018.

Promessas para 2018

Durante a audiência pública de 7/3, o deputado Ricardo Vale anunciou que já havia destinado R$ 1.000.000 (um milhão de reais) para serem utilizados no Boleiros este ano. E que por conta das demandas das outras modalidades, estará destinando mais R$ 1.000.000 (um milhão de reais). Ou seja, R$ 2.000.000 (dois milhões de reais). Logo na sequência, o chefe de gabinete do deputado Julio César Ribeiro informou que o parlamentar também já teria disponibilizado R$ 500.000 (quinhentos mil reais) para este ano e que aumentaria sua destinação com mais R$ 500.000 (quinhentos mil), totalizando R$ 1.000.000 (um milhão de reais). Também na mesma audiência, foi anunciado que o distrital Wasny de Roure já disponibilizou R$ 300.000 (trezentos mil reais) para 2018, sendo que deste valor, teria R$ 46.512.000 (quarenta e seis mil, quinhentos e doze reais) disponíveis.

Vamos ficar atentos para a verba que cada deputado, de fato, vai disponibilizar para o Boleiros de 2018.

(Matéria atualizada em 9/3, às 11h27).

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